quinta-feira, dezembro 20, 2012

LIBERTAD ALFON!

Nesta Europa a andar para trás, os sinais de perseguição a quem divirja da ideologia dominante são cada vez mas alarmantes. A Greve Geral europeia de dia 14 de Novembro teve importantes acontecimentos em todos os países. Desta vez, vamos até Espanha, mais propriamente Vallekas, em Madrid, capital do reino espanhol.

Vallekas mantém ainda hoje as suas tradições antifascistas, num bairro com cerca de 300.000 habitantes. O bairro dos subúrbios madrilenos foi um importante espaço de resistência à ditadura de Franco, o que lhe valeu o apelido de "pequena Rússia". O orgulho de classe continua a ter uma marca profunda e tem o seu expoente nos adeptos do clube do bairro operário, o Rayo Vallecano. Os Bukaneros, claque do Rayo, são um grupo assumidamente antifascista e, na última Greve Geral, pagaram por isso. Como poderão ver nas imagens que ilustram o texto, os Bukaneros utilizam a curva, 'la grada', para enviar mensagens políticas e sociais, pelo que começam a ser incómodos para todos os poderes.



Espanha: estado opressor

Nos últimos tempos a repressão acentuou-se generalizadamente na Europa, particularmente no país vizinho. Das detenções arbitrárias no País Basco, às acusações de apologia ao terrorismo do poeta e rapper Pablo Hasel e do produtor Marc Hijo de Sam, que lhes valeram vários dias na prisão.

Na noite de 13 para 14 de Novembro, Alfonso Fernández, de 21 anos, saiu de casa com a namorada para participar num piquete de greve. Perto de casa foram ambos detidos e levados para uma esquadra sem motivo aparente. Seguiram-se interrogatórios por polícias de cara tapada, ameaças a familiares e, para surpresa do próprio, uma acusação de posse de explosivos, que pode resultar numa ena de prisão entre quatro e oito anos. E mais ameaças e pressão para uma autoconfissão.

Nas diligências efectuadas em casa de Alfon nada foi encontrado. Alfon serviu também de desculpa para uma invasão policial de um dos pontos onde os Bukaneros costumam reunir-se. E, mais uma vez, nada de incriminatório foi encontrado.


Acabar com os Bukaneros?

É convicção generalizada entre os membros dos Bukaneros que Alfon está a servir de bode expiatório para uma possível ilegalização do grupo de adeptos. Estes têm-se destacado na denúncia da corrupção do futebol moderno, contra os horários absurdos dos jogos do campeonato espanhol e os jogos do campeonato às quintas-feiras. Tudo a bem do interesse económico das televisões e das direcções dos clubes e contra o que o futebol deve ser: uma festa de adeptos para os adeptos.



Marcha proibida
Os Bukaneros, a IU, associações sindicais e movimentos sociais organizaram uma série de eventos de solidariedade, que culminariam com uma marcha, no dia 15 de Dezembro, até aos estabelecimento prisional onde está Alfon. A marcha foi considerada ilegal e acabou por não se realizar. Alfon estava proibido de efectuar telefonemas desde a quarta-feira anterior. Curiosamente, no sábado, a sua mãe recebeu um telefonema. Era Alfon. Avisava a sua mãe que, caso a marcha se realizasse, seria enviado para as Canárias... O direito de manifestação está ameaçado também em Espanha.



Alfon continua detido
Alfon está ainda hoje detido, em prisão preventiva. É o único detido em toda a Europa por eventos relacionados com a Greve Geral. Primeiro, devido a pressões de altas instâncias judiciais, o argumento utilizado era a possibilidade de fuga, que foi depois descartada. Agora, continua detido por, supostamente, ser uma ameaça à paz social. Todo o contacto que tem com familiares, amigos e mesmo advogados tem a presença de elementos policiais. O amigos que lhe escreveram para a cadeia estão a ser perseguidos e investigados pela polícia.


Silêncio mediático, UE calada
Parece incrível mas estamos a falar de um estado da União Europeia, que deveria ser o farol das liberdades e garantias dos seus cidadãos. Que não o é já todos sabemos. Só não estávamos habituados a que não o fosse tão descaradamente. Os media mainstream também não dão importância ao caso. Apenas blogs e redes sociais vão impedindo que este caso caia no esquecimento e que um jovem permaneça na cadeia por ter consciência de classe, por ser inconformado, por não se resignar.

Pablo Hasel, também ele ex-detido, fez este poema em homenagem a Alfon, onde consta também o testemunho da mãe do jovem.



Toda a informação aqui: LIBERTAD ALFON!
Também no Facebook: ALFON LIBERTAD!

Espero, em breve, ver nas curvas portuguesas uma tarja que seja a solidarizar-se com Alfon.

Partilha e divulga!

Adenda: entrevista com a mãe de Alfon:

(Reparem na música do genérico do programa)


segunda-feira, dezembro 17, 2012

Violência inqualificável*



Nos últimos tempos temos assistido a uma escalada de violência miserável. No concelho de Matosinhos, os duelos entre irmãos intensificam-se e ainda estamos a dez meses das eleições, com o trio Narciso-Guilherme-Parada a semi-apresentarem-se como candidatos à presidência da Câmara Municipal.

Narciso está mais ou menos resguardado, vai fazendo a sua campanha estratégica de só aparecer quando interessa. Já Guilherme Pinto e António Parada regressam a um registo que foi habitual no PS de Matosinhos e terminou tragicamente na lota.
Nas últimas três grandes iniciativas do PS de Matosinhos, seja o PS do actual presidente ou o PS do candidato Parada, o resultado foi péssimo.

Nas eleições para a concelhia houve de tudo, desde a vandalização de carros até insultos e outros mimos; seguiu-se a tristemente célebre reunião de Guifões, que teve o seu auge com a agressão a uma jornalista e a polícia no local para acalmar os nervos. Mais recentemente, um jantar de apoio a Guilherme Pinto terminou também com confrontos e a presença da polícia.

A luta pelo poleiro anda quentinha, mas o concelho merece melhor. Melhor que esta política, melhor que este tipo de política e melhor que estes protagonistas.

*Publicado, originalmente, na edição de dezembro do Notícias de Matosinhos

sexta-feira, dezembro 14, 2012

Isto é Portugal


Clica na imagem para ver a reportagem - Na imagem, a jovem tem 19 anos e um filho de 16 meses. Todas as noites percorre, com o filho, 16 contentores do lixo à procura de roupas.


Ontem a RTP fez serviço público. Esta reportagem de 40 minutos é o reflexo de um país a que fechamos os olhos. Eu obrigaria todos a verem esta reportagem. Querem fazer cidadania? Vejam esta reportagem. E pensem. Não consigo escrever ou descrever mais sobre o que vi ontem.


A reportagem foi também ouvir Isabel Jonet. E cada um que tire as suas conclusões. Eu tirei as minhas e continuam a corroer-me por dentro:

Isabel Jonet: "Eu penso que é mais correcto falar-se em carências alimentares, porque há que relativizar até a situação que se passa nos países mais desenvolvidos e o que se passa nos países subdesenvolvidos, como África. E, portanto, temos que relativizar e falarem carências alimentares".

Jornalista: "Mas estas mães que encontrámos nas escolas falam-nos em fome..."

Isabel Jonet: "Pois, porque é tudo um olhar relativo sobre a situação que tinham previsto ter. Se for para África, há pessoas que não comem mais do que uma tigela de arroz por dia. De facto, esses têm fome. Há muitas famílias cá em Portugal que não têm uma refeição completa por dia. Há mutitos idosos, nomeadamente idosos, que vivem sozinhos, que não comem uma refeição completa todos os dias".

Jornalista: "Mas isso não é fome..."

Isabel Jonet: Isso não é fome. Mas são os idosos. No caso das crianças, todas aquelas crianças que podem ir às cantinas escolares ou que são apoiadas... que frequentam ATL, Instituições de Solidariedade Social, ATL, cheches, etc, é-lhes garantida uma refeição na, na , na insituição durante o dia. Muitas chegam a casa e já não jantam.

Jornalista: "Mas isso é uma carência alimentar, não é fome..."

Isabel Jonet: Não é. Eu acho que é uma carência alimentar.

quarta-feira, dezembro 12, 2012

Soares no seu labirinto


Que me perdoe Gabo, que nem Soares é Bolívar, nem eu sou Gabo, mas o labirinto em que Mário Soares se move é digno de um romance. É um personagem dado a sentimentos extremos, de todos os quadrantes. Amado ou odiado. Dentro e fora dos vários PS, entre o que levantou Alegre e o que o apoiou com Sócrates. Soares tem debitado tudo o que lhe vem à cabeça seja na página cheia de caracteres que tem no DN, seja em entrevistas que, de vez em quando, vai dando por aí.

Nós temos esta coisa de condescender os mais velhos. Deve ser do fado. A culpa é do fado. "Abaixo o fado", já dizia Vasco Santana, n'A Canção de Lisboa. Nós temos, mas eu não gosto, nem condescendo. Soares tem demasiadas responsabilidades para que possa fazê-lo.

Ontem voltou a dar cartas numa entrevista à TVI24 e o que fica não é digno de quem foi Presidente da República durante dez anos, Primeiro-ministro e deputado no Parlamento Europeu, e, mais que isso, de alguém que terá combatido o fascismo de Salazar.

Dizer que "nem no tempo de Salazar viu tanta fome no país" é mentiroso. E perigoso. Não perigoso no sentido em que pode incendiar ainda mais os ânimos - para mim, o ponto de ruptura estará em 2013 -, mas no sentido de banalizar aquilo que foi o regime de Salazar. Soares acordou agora de um sono profundo da era Sócrates, em que os amanhãs cantavam e o país prosperava, mas isso não pode dar-lhe o direito de dizer tudo.

Não nos equivoquemos: eu tenho tanta simpatia por este governo como Mário Soares. É, de facto, um governo criminoso, económica e socialmente, a miséria é real e aprofunda-se diariamente. Hoje mesmo, com a indemnização por despedimento a baixar para 12 dias por ano de trabalho. Ou seja, quando se pretende baixar a despesa com as funções sociais do Estado, empurram-se as pessoas para essa dependência.

Soares não se lembra de não haver gente sem dinheiro para o pão no tempo de Salazar, como não se lembrará do que significou para o país a entrada na UE e o fim de tudo o que era produção nacional. Mais grave, Soares não se lembra de que era Primeiro-ministro nas duas anteriores intervenções do FMI em Portugal, em 1977 e 1983. Na altura, como hoje, o que existiu foram redução de salários, subida de impostos, cortes no subsídio de Natal, entre outras medidas que hoje já não nos parecem estranhas. O que foi a fome em todo o país e particularmente na península de Setúbal naqueles anos.

Soares faz agora o papel de Alegre com Sócrates. A diferença é que o PS não está no poder e não quer eleições, particularmente num ano como 2013. Não quer porque tem Seguro e Seguro não é visto como um líder, e António Costa, ao recandidatar-se a Lisboa, parece estar mais interessado em ser Presidente da República do que líder do PS para candidato a Primeiro-ministro; não quer porque é um ano de autárquicas e as lutas internas pelo poder em cada quintal vêm ao de cima.

Então, para que serve o palavreado de Soares se não é escutado dentro do seu próprio partido?

Se é certo que temos de olhar em frente, não podemos esquecer o que está para trás na história recente do país. E os vários PS, incluindo o de Soares, não estão isentos de culpas.

Soares está cansado e nós estamos cansados de Soares.

O miúdo veste o quê?


O Tiago já deixou aqui uma compilação dos artigos dedicados pelos opinadores do Expresso ao XIX Congresso do PCP. Se as respostas dadas por mim e pelo Francisco respondem ao Daniel Oliveira e ao Henrique Monteiro, vi hoje um novo artigo relacionado com o Centro de Trabalho Vitória.

Com o sugestivo título "O PCP veste Prada... e Gucci!", o miúdo ali em cima, de nome João Lemos Esteves, debita uma série de lugares-comuns e factos errados que, tendo em conta o facto de escrever num blog do Expresso, poderá valer-lhe um grande futuro no grupo de Balsemão.

Por pontos, o escriba dedica-se a especular sobre os comunistas; o que são, os seus Centros de Trabalho, como vivem e o que vestem. Vamos, assim, responder ponto por ponto.

Ponto 1 - "As crenças de criança" estão em todo o artigo. O autor ignora o facto de o PCP, quando adquire um imóvel, não poder controlar a vizinhança. É mais ou menos como nos blogs. Eu não controlo, e ainda bem, porque me divertem, os disparates que se escrevem noutros blogs. O "partido marginal" no panorama político e social é mais uma "crença de criança" do miúdo.

Ponto 2 - O PCP convive na Avenida da Liberdade com quem passou a existir ao seu lado. Sem qualquer preconceito que os preconceituosos anti-comunistas acham que os comunistas têm. Ao "luxuoso edifício" iremos mais à frente.

Ponto 3 - O miúdo acha que os Centros de Trabalho do PCP não devem ter televisão, menos ainda Sport TV. Pode parecer-lhe estranho, mas os Centros de Trabalho do PCP até têm - imagine-se - computadores com internet! Os Centro de Trabalho que reúnem condições para tal são espaços onde os militantes e não-militantes convivem. Não, ao contrário do que pensa o miúdo, a vida dos comunistas não se resume ao Partido. Até porque o Partido está em tudo o que os seus militantes fazem. No futebol também. Pode passar pela Catedral da Luz e por lá verá artigos de comunistas sobre - espante-se - futebol.

Ponto 4 - O miúdo delira.

Ponto 5 - O miúdo gostava que assim fosse.

Ora, voltando ao CT Vitória, a ignorância do miúdo é algo de tão atroz que serve para explicar tudo o mereceu ser replicado acima - pontos houve que só existem na cabeça do autor. Assim, aqui fica para informação:

Adquirindo o edifício em 1984 (graças à campanha «60 mil contos para o Vitória»), o PCP empreendeu desde então diversas obras de recuperação e reintegração do edifício no seu desenho original, bastante degradado sobretudo a partir dos anos 60. Nas obras dos anos 80 é feito um restauro de toda a fachada, repondo a pala circular sobre a entrada, que fora destruída, e reconstruindo a pérgola do terraço, que ruíra no sismo de 1969. Nas obras dos anos 90 todo o piso térreo é recuperado na base dos elementos decorativos de origem. Com a passagem a Centro de Trabalho Vitória o edifício não só ganhou uma nova e intensa vida, como recuperou toda a dignidade de um dos mais singulares edifícios da cidade de Lisboa.

Ou seja, no PCP não há Somagues, Modernas, sobreiros, submarinos, financiamentos que passam pelo Brasil, Tecnoformas, etc. O PCP votou contra a Lei dos Partidos por entender que estes devem viver através da militância e empenho dos seus membros, com receitas próprias.

Por fim, alguém diga ao miúdo que o PCP não só tem um Centro de Trabalho na Avenida da Liberdade, em Lisboa, como tem outro na Avenida da Boavista, no Porto, e, pasme-se, uma quinta na Amora!

Aprender, aprender... sempre!

O Daniel não percebe

O Daniel Oliveira, que era há uns tempos a vanguarda da esquerda livre e democrática na blogosfera, não percebe como é que o PCP pode começar um congresso a uma sexta-feira, sendo um dia de semana. Ou melhor, percebe e conclui:

"Só de uma forma: se uma parte significativa desses delegados trabalharem para o partido, forem eleitos para cargos políticos com disponibilidade a tempo inteiro ou forem assalariados de organizações que lhe são próximas".

Há muita coisa que o Daniel Oliveira não percebe, mas, centrando-me apenas nesta, eu explico:

É possível começar com o exemplo da Festa do Avante!. Como podem os comunistas construir uma evento político, cultural, artístico daquela dimensão? Pela lógica do Daniel, seria através de funcionários do Partido ou de organizações que lhe são próximas. Qualquer pessoa que conheça a Festa do Avante! sabe que tal seria impossível. Então, como se faz?

Chama-se militância. É encarado como dever dos comunistas logo que aceitam o Programa e Estatutos do Partido. Eu utilizo dias de férias para ajudar a construir a Festa do Avante!, como fazem centenas de outros camaradas meus. Da mesma forma, muita gente utilizou um ou mais dias de férias para poderem estar no XIX Congresso.

Parecerá estranho ao Daniel que o tempo de cada um seja utilizado da forma que pretende, no caso, para participar num acto de cidadania que é a militância política activa?

Explica-se assim, de forma simples, uma mentira absoluta tida como verdade certa pelo Daniel.

Já agora, como foi possível organizar tantas assembleias e reuniões para que fossem discutidos o programa, estatutos e teses? Eu explico também. Por milhares de trabalhadores, estudantes, reformados que consideram importante estar na discussão do que queremos que seja o Partido.

Não era preciso ser muito inteligente para perceber isto. Mas estamos a falar do Daniel Oliveira.

segunda-feira, dezembro 03, 2012

Em stereo

Desde a semana passada que estou em stereo no Artigo 58.  Os artigos serão publicados também aqui, logo que seja possível.

sexta-feira, novembro 23, 2012

Relvas, o mestre da táctica

Miguel Relvas não é doutor, mas não é por isso que deixa de ser esperto. A polémica das imagens da manifestação foi um pretexto óptimo para dar um passo no caminho pretendido por este governo para a RTP.

A saída de Nuno Santos - independentemente de qualquer balanço que façamos sobre a sua passagem pelo cargo de director de informação - da forma que ocorreu, pretende lançar o descrédito sobre a RTP e os seus trabalhadores e, de uma forma mais ou menos obscura, provar que como está a RTP não serve. No dia em que, supostamente, alguém exterior à RTP viu as imagens, nem Nuno Santos nem Vítor Gonçalves estavam, sequer, em Portugal.

A história tem dedo de Relvas. Luís Marinho prepara-se para assumir o cargo de Nuno Santos e o Governo fica assim com um homem de mão à frente da informação. Para breve, virá uma "reorganização" das direcções editoriais.

Luís Marinho tem currículo que agradará a Relvas. Recordemos Raquel Freire:

Raquel Freire confirma na ERC versão de que crónicas acabaram por imposição de Luís Marinho

quinta-feira, novembro 15, 2012

Uma grande Greve Geral

Foi uma enorme Greve Geral. (ponto) 

No Porto, centenas de pessoas, sindicalizadas, não sindicalizadas, empregadas, desempregadas, deslocaram-se à Casa Sindical da União de Sindicatos do Porto com o propósito de participar nos piquetes.

Foi o maior piquete de que tenho memória. Ok, não sou assim tão antigo, mas isto é um facto. No Porto, apesar de haver quem ache que se diz sempre que "esta greve foi maior que a anterior", o facto é que, a sensibilidade de quem lá esteve é que foi, de facto uma grande greve, que decorreu praticamente sem incidentes.

O piquete montado pelos trabalhadores dos STCP em Francos era significativo, algumas dezenas de trabalhadores à porta da empresa, ainda antes da meia-noite. Os que chegaram mais tarde engrossaram as fileiras e ali estivemos tranquilamente. Ninguém chegou para trabalhar até perto das 4 da manhã. Os que chegavam, acabavam por juntar-se ao piquete. Na recolha da Via Norte, o mesmo filme. Na estação de S. Bento, às 9 da manhã nem um comboio partira. Apesar da figura sinistra que é presença assídua na provocação aos piquetes de greve.

Mesmo com uma noite gelada, a adesão aos piquetes era massiva.

Pelo meio, alguns episódios a assinalar.

As misteriosas carrinhas de entrega de jornais e o desejo gorado dos Precários Inflexíveis

Quem conhece a Lei da Greve sabe que, em dias de greve, é aos piquetes das empresas ou designados pelos Sindicatos ou Centrais Sindicais que compete garantir a segurança das instalações. Por esse motivo, os piquetes dividem-se dentro e fora das instalações das empresas. Pelas duas da manhã, em Francos, surge uma carrinha branca, que, como é normal, é abordada pelo piquete. Não se sabia se era algum trabalhador e era pretendido falar com ele, cumprindo outro papel legal do piquete: procurar dissuadir o trabalhador.
A carrinha, ao aproximar-se, abrandou e depois acelerou em direcção ao piquete, o que fez aquecer os ânimos. A PSP, com uma presença normal para a ocasião acorreu ao local e - creio - acabou por identificar o condutor.

Episódio sanado e tudo normal. A carrinha continuava junto ao portão.

Vinte minutos depois, surge outra carrinha e a história repetiu-se. Para a saída das carrinhas, foi o piquete a formar um cordão para que as duas carrinhas pudessem sair em segurança. Para surpresa de todos, as duas pararam 50 metros à frente. Outra vez ânimos exaltados, mas nada de muito grave.

A noite continuou muito fria.

Pelas sete da manhã, surgia também alguma tensão junto à estação de recolha da Via Norte, quando alguns autocarros se perfilavam para sair. No entanto, o piquete voltou a funcionar. O "piquete" dos PI chegou por volta dessa hora e apressou-se a tuitar que tinha havido uma carga policial com recurso ao Corpo de Intervenção. Nada mais falso. Nem houve carga policial nem lá estava o CI.

Foi, assim, uma noite tranquila, com trabalhadores unidos num propósito e uma mobilização de que, como recordei, não tenho memória.

QUESTÕES MARGINAIS

A meio da noite, surgiu a notícia de detenções em Matosinhos, após terem sido vandalizadas cinco dependências bancárias. Dois estudantes, de 18 e 19 anos, recorreram ao que foi lançado por um conhecido site de reprodução de notícias, o Tugaleaks, através de vários apelos de pelo menos um dos seus membros, via twitter e facebook, para o recurso à "acção directa". Mesmo sem terem a mínima noção do que é, de facto, acção directa.

A violência junto à AR era mais do que prevista, por vários motivos. A desvalorização constante das greves e das manifestações, por maiores que sejam, por parte dos vários governos e dos seus agentes que surgem nas colunas de opinião da Comunicação Social é um deles. Consciente ou inconscientemente, o que estão a fazer é a empurrar cada vez mais gente para o protesto violento.  Depois há os que acabam os editoriais demasiado cedo e acabam por passar mentiras para a opinião pública. Mas certamente que o Paulo Ferreira, na edição de amanhã do JN, fará um desmentido do que disse hoje.

Mesmo que o apedrejamento da polícia tenha sido obra de meia-dúzia de burguesinhos indignados com tudo e mais alguma coisa, até com a CGTP, a verdade é que o desespero acentua-se de dia para dia e pode ter consequências bem mais graves do que o sucedido na AR. A carga policial só não era esperada por quem não tem noção da realidade. Quem lá ficou devia saber o que aí vinha.

O desespero acentua-se. E quem pouco ou nada tem a perder, protestará cada vez mais e de forma mais contundente. A ver vamos como será no dia 27. A ver vamos como será depois de os trabalhadores terem uma noção real do que lhes é roubado, quando receberem o recibo de vencimento de Janeiro. A ver vamos quando perceberem os cortes no subsídio do desemprego. A ver vamos quando tiverem consciência do roubo a que estamos a ser sujeitos.

Importa realçar que a manifestação da CGTP já tinha acabado há muito tempo, mas que milhares de pessoas continuaram em frente à AR, o que também é de registar e analisar aprofundadamente dentro da Central Sindical.

Artigo 21.º da Constituição da República Portuguesa:
Artigo 21.º
Direito de resistência
Todos têm o direito de resistir a qualquer ordem que ofenda os seus direitos, liberdades e garantias e de repelir pela força qualquer agressão, quando não seja possível recorrer à autoridade pública.

terça-feira, novembro 13, 2012

GREVE GERAL! - Dia de Acção e Solidariedade


A Greve Geral está prestes a começar. Deixemos de lado os Proenças deste mundo e as suas previsões/desejos do inêxito da Greve Geral. Deixemos de lado o medo que alguns querem incutir.

Amanhã, por toda a Europa, os trabalhadores exercerão os seus direitos de greve e manifestação.

Mesmo que isso custe a gente desta, a quem a democracia é estranha, e que acusa os trabalhadores dos portos de estarem a aprofundar a crise e, no entanto, compram meia página no Público. (clica para ampliar)

sexta-feira, novembro 09, 2012

Quem manda na UGT?


No dia 1 de Outubro, quando estava anunciada a mais que necessária Greve Geral da CGTP, o secretário geral da UGT, João Proença, foi bastante claro nas suas afirmações, que podem ser conferidas no vídeo abaixo. "Marcar greve geral está fora de questão e sobretudo aderir a uma greve da CGTP ou ir para a rua dizer não à troika quando nós precisamos da Troika".




Proença falava então no plural, vinculando assim a direcção da UGT a uma decisão que, pela forma como foi explicada pelo próprio, parecia colectiva, com um grande consenso dentro da organização.

Um mês e um dia depois, Proença vinha já afirmar que, afinal, vai aderir à Greve Geral, porque o seu sindicato,  FESAP, decidiu aderir à greve geral. Talvez a FESAP se tenha sentido pressionada pela grandiosa manifestação da UGT no dia 26 de Outubro, que mobilizou milhares centenas dezenas de trabalhadores.





Curiosamente, hoje ficámos a saber que mais de metade dos 50 sindicatos afectos à UGT vai aderir à greve geral do dia 14 de Novembro. Recordemo-nos desta notícia. Vamos guardá-la bem para, mais tarde, o mesmo Proença não vir dizer que a CGTP mente quando diz que sindicatos afectos à UGT aderiram à greve.

Por fim, cabe então perguntar quem manda na UGT? O órgão executivo da UGT consiste apenas no João Proença? Felizmente, a ligação da UGT ao PS faz dela uma central democrática, de outra forma, teríamos o caldo entornado.

A greve geral é dos trabalhares e do povo, foi deles que partiu a exigência. Mas Proença não o sabe, porque deve andar entretido a coleccionar os elogios de Passos Coelho, Nuno Magalhães e do patrão dos patrões.

Dia 16, lá estaremos. Trabalhadores ao lado de trabalhadores. E tu, Proença?

domingo, outubro 28, 2012

A maratona de Gaspar

A tremenda habilidade de Vítor Gaspar para tratar das finanças do país é semelhante à sua capacidade de gerar momentos embaraçosos para esta espécie de comissão liquidatária que está à frente dos destinos do rectângulo.

Gaspar não tem aspecto de quem faça as suas corridinhas. Não faz mal, há não muito tempo tivemos por cá quem se passeasse em corridas matinais com as câmaras de tv atrás e esse também não deixa saudades. Aqui, estou com o Gaspar: também não gosto de correr. Faço-o quase diariamente porque sei que faz bem e com dois objectivos, que são a saúde física e mental.

Gaspar calçou as sapatilhas e fez-se ao caminho das metáforas com a maratona, ainda por cima com a fase final. Não sei o que será para ele a fase final. Sei que pode ser agonizante. Há entre os maratonistas aquilo que é chamado de "o muro", ocorre cerca dos 30km da prova e é a fase mais difícil dos 42,8km. As falhas musculares afectam também a mente dos atletas e muitos acabam por desistir.

Há portugueses que já desistiram da maratona. Deixaram o país e a prova de afundo. Muitos outros continuam por cá, nesta maratona miserável a que estão a condenar-nos. Gaspar acha que o pior já passou.

Gaspar é sebo. Sebo, sim. O Sebo que Francisco Lázaro usou em 1912 e o levou à morte nos Jogos Olímpicos desse ano. O maratonista cobriu o corpo com sebo para o impedir de suar. Neste momento, somos todos Francisco Lázaro.

O governo de Gaspar e companhia cobre-nos com sebo que nos asfixia todos os poros e acabará por levar-nos à morte. Assim nós o deixemos e não nos hidratemos de todas as formas possíveis. Francisco Lázaro não teria morrido se tivesse tomado um banho. Um banho simples, que os colegas da comitiva portuguesa daquela edição olímpica não conseguiram convencê-lo.

E ele foi morrendo a cada passo que dava. E nós precisamos de um banho. Um banho que limpe o sebo.

segunda-feira, outubro 22, 2012

Tribuna Pública contra a extinção de freguesias



PORTO - TRIBUNA PÚBLICA – CONTRA A EXTINÇÃO DE FREGUESIAS
27 de Outubro – 15H30 – Praça dos Poveiros

A Plataforma Nacional Contra a Extinção de Freguesia agendou para o próximo dia 27 de Outubro, Sábado, uma jornada nacional de luta contra a extinção de freguesias. Por todo o país, em vários distritos e concelhos, vão decorrer acções em defesa do poder local e contra a proposta de reorganização administrativa que o governo quer impor, e que apenas visa liquidar freguesias. Nenhum autarca foi eleito propondo a extinção da sua freguesia, e por isso não podemos aceitar ser os “coveiros” das nossas freguesias.

É com este sentimento que a grande maioria das Assembleias Municipais e das Freguesias não têm apresentado qualquer proposta de reorganização administrativa na sua respectiva área de actuação. É com este mesmo sentimento que a luta contra a extinção das freguesias vai continuar.

No distrito do Porto, a Plataforma Nacional Contra a Extinção de Freguesias e o STAL vão promover uma TRIBUNA PÚBLICA, no próximo dia 27 de Outubro, pelas 15h30, na Praça dos Poveiros, com os seguintes objectivos:

Em defesa do Poder Local Democrático
Contra a Extinção de Freguesias
Pela manutenção dos serviços públicos de proximidade
Pela defesa dos trabalhadores da administração local

A luta tem de continuar! Pela defesa das nossas freguesias! As freguesias são do povo!


quinta-feira, outubro 04, 2012

Censura e Greve Geral - uma orgia em forma posta

Conta-se aqui que quando uma minhoca olha para um prato de esparguete pensa: "olha, uma orgia"!

O que sucedeu nos últimos dias foi mais ou menos uma orgia. CDS e PSD mais ou menos enrolados e o PS naquela situação confortável de "agarrem-se se não eu mato-os". Pelo meio, manifestações gigantescas, umas inorgânicas, outras convocadas pela CGTP. A segunda, levou a observações ao minuto e acompanhamento de tuiteiros de sofá que afirmavam que, segundo as imagens aéreas, a CGTP não tinha conseguido encher o Terreiro do Paço. Depois calaram-se, porque a realidade superou a ficção.

Entretanto, após a polémica da TSU, que o PS cavalgou para reclamar a vitória no recuo do governo - desvalorizando as acções de massas -; o PS voltou a ser igual a si próprio: o partido da rosa. De esquerda, só tem a mãozinha com que aparece nos boletins de voto.

Impressionante mesmo é a forma como, em duas semanas, a moção de censura que o PS colocou em cima da mesa deixou de fazer sentido, quando foram apresentadas outras duas, uma delas pelo PCP. Segundo o líder parlamentar Carlos Zorrinho, "as moções de censura só fazem sentido quando são para derrubar um governo". Portanto, Zorrinho acreditava mesmo que o CDS seria um partido com princípios e abdicaria dos lugares de governo. É enternecedor, mas também é de um a credulidade chocante vinda de alguém há tantos anos na vida política. 

Para o PS, o roubo de um salário só seria mau se fosse conseguido através da TSU. Uma moção de censura contra o roubo de mais de um salário através do IRS, do IMI, ficará para "análise depois de aprovado o Orçamento de Estado de 2013", segundo a eurodeputada Edite Estrela.

Sintomático do limbo em que se encontra o PS foi a sua abstenção (violenta?) nas moções. Mais; o PS doeu-se mais pela apresentação das moções do que o próprio governo. Apesar disso, nas intervenções durante a manhã de hoje, a bancada do PS teceu duras críticas ao governo. Mas depois absteve-se.

Refira-se que no texto da moção do PCP, apenas há duas referências ao PS, que passo a transcrever:

"O Governo PSD/CDS intensificou - a partir da aplicação do pacto de agressão que constitui o memorando assinado por PS, PSD e CDS com a troica estrangeira - uma violenta ofensiva contra os trabalhadores, o povo e o País, que se prepara para acentuar na proposta de Orçamento do Estado para 2013."

 (...)



"Os 36 anos de política de direita, aplicada por sucessivos Governos, mesmo depois de prometerem mudanças que nunca fizeram, levaram o País à situação em que se encontra. A aplicação do pacto de agressão - subscrito por PS, PSD e CDS com a troica, com o apoio cúmplice do Presidente da República – é o cerne da política do Governo. A rejeição do pacto de agressão, a derrota do Governo PSD/CDS são indispensáveis para abrir caminho a uma verdadeira mudança de política, que não se basta com a eliminação pontual de medidas ou com a alteração da forma como são apresentadas ou aplicadas."

Não sei se o PS pretenderia colocar-se à margem do memorando. Mas foi assinado pelo partido, pelo que qualquer referência ao mesmo obrigaria à inscrição da sua sigla. Antes não fosse assim. 

Surgiu pelo meio da confusão a reclamada e mais que justa greve geral da CGTP, à qual Proença e a sua central, UGT, disseram desde logo que não. O desemprego não lhe afecta a barriga, os baixos salários também não. O facto de os trabalhadores terem os seus rendimentos ao nível de 1999 não lhe faz confusão.

Já não espanta a mim, que vou a caminho das três décadas, deve espantar ainda menos os mais velhos e os mais atentos. Pode ser que volte a perder tempo com esta organização criminosa mais lá para a frente. Criminosa, sim, para com aqueles que tem o dever de defender.

Ficamos pois, com duas tarefas árduas, às quais já estamos habituados: combater a pressão dos patrões e a desinformação da UGT para que seja uma grande greve geral.

Uma palavra ainda para o CDS, que tenta a todo o custo passar por entre os pingos da chuva mas acabou com Paulo Portas encharcado, depois da intervenção de Honório Novo

Nós estamos a fazer história. E voltaremos a fazê-la no dia 14 de Novembro.

E só há dois lados nesta barricada. "Se o governo não ouvir os trabalhadores a bem, irá ouvir os trabalhadores a mal".

 
O nosso pai era um sindicalista,
Um dia serei também.
O patrão demitiu o meu pai,
O que vai a nossa família vai fazer?

Venham todos os trabalhadores,
temos uma boa notícia
Vou dizer-vos como o Sindicato 
está aqui de pedra e cal.

Refrão:
De que lado estás?
De que lado estás?

O meu pai era mineiro
e eu filho de mineiro sou
E estarei com o sindicato
até que todas as batalhas terminem.

Dizem que em Marlan não háneutralidade,
preferes ser um sindicalista,
ou um cão de fila para J.H Blair?

Trabalhadores, conseguem suportar isto?
Diz-me se serás um rato,
ou serás um homem?
 
Não creiam nos patrões,
Não ouçam as suas mentiras
Somos gente pobre,
não temos futuro 
se não nos organizamos.
 
 

quarta-feira, setembro 26, 2012

Crónica de duas reformas anunciadas II

O PAI

Nascia na Rua Óscar da Silva, a 1 de Setembro de 1951. Luís Fernando Pereira dos Santos era então o terceiro filho de uma família que viria a conhecer mais sete. De Leça, pois claro. Foi reformado a 1 de Setembro de 2012, com 700 euros, ao fim de 40 anos de descontos e 51 de trabalho.

Filho de Fernando Pereira dos Santos e Maria Celeste, sim, sem apelidos. Fernando Pereira dos Santos era comerciante, alegadamente abastado. Teve um dos primeiros automóveis a surgir nas vielas de Leça. Poderia ter sido de facto abastado, não fosse gastar tudo em casas de má fama.

Vivia-se mal para além das aparências, como qualquer família viveria mal com 12 pessoas numa casa na década de 50. Luís Fernando frequentou a Escola da Amorosa, como os restantes nove irmãos.

Luís teve como professor da primeira classe João Teixeira Pimenta, um dos homens marcantes na história de Leça da Palmeira, que ajudou a fundar o Rancho Típico da Amorosa.Tinha também um professor de ginástica, Hernâni, conhecido por "Pica Orelhas". O cognome surgiu, está fácil de ver, porque era adepto das orelhas dos alunos.

Certo dia, na quarta classe, o professor Hernâni, durante uma aula de ginástica, deu um murro na barriga de Luís que o fez vomitar tudo. O exercício consistia em manter a barriga para dentro e Luís, na altura uma radiografia, conseguiu mantê-la para fora. Foi o fim das aulas de ginástica. Fernando Pereira dos Santos foi à escola saber por que motivo o professor havia batido no filho. Foi decidido que, como não fazia do que mandava o professor Hernâni, deixaria de frequentar a disciplina.

Luís tinha como companheiro de carteira Rui, que se manteve até à quarta classe, e, do professor Pimenta, levou apenas dois "bolos", reguadas, por estar a jogar aos cabazinhos (caricas) em cima da carteira.

Como era filho de comerciante, logo de gente com posses,não tinha direito ao lanche da escola. Ficava por isso a olhar, enquanto os meninos comprovadamente carenciados e atestados pela aparência comiam o pão com queijo amarelo.

Luís sempre foi apreciador de mulheres bonitas, não tivesse ele, anos mais tarde, vindo a casar com Elisa Magnífica Meireles - lá chegaremos. Vinha da catequese e estava a construir-se a Avenida Dr. Fernando Aroso. Nas valas, alguns escondidos entre os tubos. O esquema estava montado. Luís, Júlio, Zé Carlos e outros revezavam-se e desafiavam as raparigas a fazerem como eles: atravessarem a vala, com as pernas abertas, uma perna para cada lado. Elas estavam de saias, eles não. Eles viam o que queriam e elas ainda hoje não sabem o que lhe foi visto.

Incrivelmente para quem conhece hoje Luís Fernando, Fernando Santos achava que o filho tinha vocação para padre, fruto da influência do tio João, jesuíta e que ainda hoje espalha a fé pelas igrejas. Chegou mesmo a estar matriculado no seminário onde estava o tio, mas o padre Alcino intercedeu após uma conversa com Luís Fernando:

- Não queres ser sacerdote?
- Não. Nem gosto da escola.

Não foi. Saiu da escola aos dez anos e entrou para o negócio da família. Foi trabalhar para a oficina de Fernando Santos, que tinha marca própria de bicicletas e tudo: FERSAN.

Maria Celeste era a mulher da casa. Aturava os 10 filhos e o homem com quem havia casado, que estava longe de ser um marido.

Era, no entanto, uma casa de gente de bem: benfiquistas por obrigação. Fernando Pereira dos Santos não facilitava em determinadas coisas.


Bicicleta FERSAN:

segunda-feira, setembro 24, 2012

Crónica de duas reformas anunciadas I

Sou oficialmente filho de dois reformados. Reformas negras de vidas douradas, ao invés das tão famosas reformas douradas conseguidas por meios mais ou menos obscuros.

A Mãe

A minha Mãe foi reformada em Novembro de 2011, com 539 euros ao fim de 44 anos de descontos e a trabalhar desde os 13. Comemorou 60 anos.

Elisa Magnífica Meireles - um nome digno de um romance de 'Gabo' - nasceu a 19 de Julho de 1952, na aldeia de Linhares de Ansiães, concelho de Carrazeda de Ansiães, distrito de Bragança. Filha de Ana Natália Meireles e da pessoa que mais filhos tinha no tempo da ditadura fascista de Salazar: o incógnito.

Mesmo toda a gente sabendo o nome do pai incógnito, Ana Natália Meireles pegou na filha e mudou-se para o Porto, passados dois anos, quando o incógnito foi para o Brasil. E ser mãe solteira em 1952 e ainda mais no interior não haveria de ser fácil. Chegadas ao Porto, com a Invicta a receber aquela que viria a ser um exemplo de força, de vida e de coragem.

Elisa chegava assim ao Porto com dois anos. Ficaram as duas em casa da Tia Adelaide, na Rua do Breiner. Ana Natália "foi servir". Era criada interna em casa de senhores abastados e visitava a filha quando podia. Assim foi até aos cinco - quase seis - anos de Elisa.

Por essa altura, casou com um pescador de Leça da Palmeira, ainda que nascido na Póvoa de Varzim. Mudou-se para junto ao mar e deixou de servir, que o meu avô - não o incógnito - não permitia que mulher que a vida fez dele trabalhasse. Ou cortasse o cabelo. Ou que tirasse o avental. Ainda a década de 60 não tinha acabado. Já em Leça da Palmeira, Elisa tinha agora um pai. Rude como só as marés sabem ser e alcoólico como só o mar é capaz de fazer com que alguém seja.

José Luís Capelão tinha já quatro filhos, mas só um vivia com ele. Elisa ganhara irmãos. Os outros viriam mais tarde, ao longo dos anos, quando deixaram a Obra do Padre Grilo ou quando a mãe adoptiva os fez retornar à procedência.

Viviam na Rua do Cidral, em Leça, numa casa minúscula como a rua que a albergava. Capelão era particularmente implicativo quando o vinho falava por ele, mas raramente era mau para Elisa. Falava antes com Ana Natália, que se encarregava de aplicar o castigo necessário. Capelão guardava as angústias das marés para os fins-de-semana. Pegava num bocado de borrachava e descarregava nos filhos a frustração de não viver do mar. E no mar. Já à mulher, batia-lhe à chapada.

Elisa era boa aluna. Um dia, disse-lhe a professora da terceira classe e directora da escola do Corpo Santo, D. Alzira: "Quando tu cresceres, vais para minha criada". Era este o prémio que as pessoas do Povo recebiam por serem bons alunos. Ser criada da professora.


Nos passeios da escola, Elisa não tinha dinheiro para pagar as viagens. Era uma colega que as pagava, vinda de uma família que se destacara na indústria das conservas. Também na catequese - obrigatória para assimilar a fé - Elisa era aplicada e viria mesmo, anos mais tarde, a ensinar a palavra do Senhor.

A partir da quarta classe, era necessário um exame para quem quisesse continuar a estudar. Por ser boa aluna, a catequista, Menina Judite, oferecera-se para pagar-lhe os estudos, falando para isso com Ana Natália. Também a professora da quarta classe, a professora Matilde Brás Lago, se ofereceu para dar explicações gratuitas para o exame de admissão.

Feito o exame de admissão no Liceu D. Manuel, Elisa passou com distinção, ficando isenta de propinas. Estavam passados os primeiros 10 anos com muito mais que merecia aqui estar, mas que não está, que há coisas que só se devem ser saboreadas no papel.

quinta-feira, setembro 20, 2012

O brinquedo é meu*



Foi notícia o caso da ambulância de S. Mamede, em que o presidente da Câmara de Matosinhos esperava uma multidão mas, certamente por motivos de força maior, atrasou-se e já lá não estava ninguém para receber tão importante personagem. Note-se a importância do acto: a reentrega de uma ambulância reparada, nem sequer era nova.

Certo é que o edil amuou e mandou recolher a viatura, que certamente, na sua cabeça iluminada, faria mais jeito parada nas oficinas da autarquia do que nos bombeiros. Com ou sem recepção e fanfarra.
Politicamente, S. Mamede de Infesta é uma espécie de Entroncamento do concelho de Matosinhos. São fenómenos atrás de fenómenos. Recordo-me de uma campanha eleitoral em que um candidato, presidente de uma associação da terra, usou os contactos dos associados para enviar cartas a apelar ao voto nele próprio. Mesmo para associados que já estavam mortos.

Vai correndo com a normalidade habitual a vida política em Matosinhos, principalmente em aquecimento para as eleições autárquicas. Desde supostas violações da conta do Twitter do Narciso Miranda, até às birras narcísicas do actual presidente, temos todos os ingredientes para mais uma campanha muito peculiar.

*Publicado, originalmente, na edição de Setembro do Notícias de Matosinhos.


Adenda:

Faz tanto sentido.

quinta-feira, agosto 16, 2012

A morte é como o sabão*

 A morte é mágica. Tem o condão de limpar tudo. Dizia-se nas margens do Leça que o sabão lava tudo, só não lava as más línguas. Afinal, é a morte. A morte é capaz de limpar o passado mais cretino de qualquer cidadão. Temos nós o hábito do coitadinho na hora da morte. “Morreu, coitado”. Mas a história não morre, pode é ser manipulada e, às vezes, apagada.

Parte do país lamentou a morte de José Hermano Saraiva, um grande comunicador, ao que parece, mas um menos bom historiador, diz quem percebe da poda.

O detalhe de estarmos a falar de um ministro da ditadura fascista de Salazar parece não incomodar quem o elogia. Lá está a morte a limpar as memórias. Diz-se que a educação era o seu grande amor. Um amor à moda antiga, daqueles que se resolvem à bastonada, como quando mandou a GNR carregar sobre os estudantes de Coimbra durante a Crise Académica.

Alguns desses, dos que foram corridos à bastonada por ordem do comunicador, elogiam-no mesmo assim, fazendo ressuscitar a triste máxima do “quanto mais me bates mais gosto de ti”. Outros, mesmo não tendo vivido esse dia, não perdoam a ditadura.

Continuo a achar que quem não foi bom em vida, não tem de ser bom porque morre.

*publicado originalmente no Notícias de Matosinhos

segunda-feira, julho 30, 2012

Começou a campanha em Matosinhos

Abriu a caça ao poleiro em Matosinhos. A declaração surgiu na conta de Narciso Miranda no Twitter em dia de aniversário do ex-presidente da CMM. Está dado o pontapé de saída. E mais alguns.




Clica para ver a foto.

sexta-feira, julho 13, 2012

segunda-feira, julho 09, 2012

mailto: Lusófona - A saga continua


A Universidade Lusófona respondeu ao meu pedido de informação, o que é de louvar. No entanto, não foi suficientemente esclarecedor:

"Caro Ricardo Santos,

Obrigada pelo seu contacto e interesse na ULP.

A legislação permite a qualquer candidato que reúna as condições de ingresso ao ensino superior, requerer a creditação de competências profissionais.

Poderá concorrer a Educação Física e Desporto pelo regime para maiores de 23 Anos  e, ficando apto a ingressar, poderá apresentar o dossier de candidatura à creditação de competências profissionais ou adquiridas.

O dossiê de candidatura à “Avaliação e Creditação de Competências Profissionais ou Adquiridas” incluirá os seguintes documentos:
a) Requerimento segundo o modelo em curso;
b) Curriculum vitae segundo “modelo europeu”, a que deve anexar-se uma descrição exaustiva de cada uma das funções e tarefas profissionais exercidas com relevo para o processo em apreço;
c) Declarações comprovativas, emitidas pela(s) entidade(s) empregadora(s), com identificação das funções, posição e período de execução das mesmas ou, quando não for possível entregar a declaração da entidade empregadora, comprovativo de desconto para a segurança social e descrição pelo próprio, da função, posição e período de tempo a que respeita;
d) Certificados ou outros comprovativos de Formação realizada;
e) Cartas de referência;

Este processo será analisado então pela Comissão Científica da Licenciatura.

Disponível para qualquer esclarecimento que julgue necessário.

Cumprimentos,

SB"


Cara SB,


Permita-me, antes de mais, agradecer a resposta ao meu contacto. Na verdade, não. Começo antes por pedir desculpa pelo português utilizado no primeiro email, que terá levado a que a sra. dra. pensasse que eu apenas posso candidatar-me à Universidade Lusófona através do programa maiores de 23 anos.


Quanto à resposta que me enviou, necessito de alguns esclarecimentos, por culpa minha, que não terei sido suficientemente claro, fruto da minha fraca formação académica, que não me permite expressar melhor.
Temos um problema de comunicação, no que concerne aos ponto b, c e d). Eu referi expressamente que não tenho qualquer currículo profissional na área de Desporto e Educação Física. Tenho apenas currículo pessoal, o mesmo que o senhor que agora consta nas manchetes. Recordo que ser deputado não é profissão, logo, a actividade profissional não terá sido levada em conta pelo menos num dos 89 casos que sucederam na Universidade Lusófona. E eu gostava de ser o número 90, que é redondinho. Foi nesse pressuposto que efectuei o contacto com a Universidade Lusófona, pois pretendo concluir a licenciatura, no máximo, em 14 meses. Informo ainda que frequentei o primeiro ano do curso de Línguas e Relações Internacionais da Faculdade de Letras da Universidade do Porto, pelo que gostaria de saber quais as equivalências de que poderei usufruir aquando da minha transferência para a Universidade Lusófona, para além das que terei devido à minha experiência e currículo pessoais.


Repare que nem faço questão de conhecer os professores que me darão a licenciatura. 

Peço especial atenção para o meu pedido, uma vez que o motivo que leva a querer licenciar-me é para fazer um gosto aos meus pais, que sempre quiseram que eu fosse doutor, nem que seja à pressão. A verdade é que eles nunca o disseram, mas eu sei que sim.


Rogo assim que revejam com atenção o primeiro email que enviei, e não me respondam com o modelo standard que utilizam para quem os contacta com mais de 23 anos.


Com os melhores cumprimentos,


Ricardo M Santos


ps: Acrescento ainda que frequento o ginásio diariamente.

ps2: Tenho uma irmã hipocondríaca que é capaz de reconhecer qualquer medicamento pelo princípio activo ou nome comercial das diferentes marcas. É licenciada em Línguas e Secretariado pelo ISCAP. Peço assim que me informem se a Universidade Lusófona possui algum curso de medicina e quais as equivalências que a senhora minha irmã poderá ter. Tendo em conta que se trata de curso de Medicina, julgo que poderemos estender o prazo de licenciatura e mestrado até 20 meses.

domingo, julho 08, 2012

Democracia e censura*


Já está. As eleições para a concelhia de Matosinhos e da distrital do Porto do PS decorreram com toda a normalidade. Por entre mensagens intimidatórias oriundas dos aliados do presidente da Câmara até vidros partidos, carros vandalizados e “militantes” que já não o são mas que continuam, como que por mistério, a ser contactados para irem votar de cada vez que há o circo, perdão, o ciclo eleitoral, há de tudo, como na farmácia.

Pode ser que, agora, os responsáveis pelo concelho possam ter algum tempo para tratarem daquilo para que foram eleitos, se não for pedir muito, e se sobrar algum tempo, depois das inaugurações de fachada para “militante” ver.

Faz lembrar o PS nacional, que continua sem tempo para política e preso no seu labirinto, a recolher cacos dos anos de Sócrates: entre a conivência com o pacto de agressão do FMI e a violência das suas abstenções.

Daí o incómodo do PS – mais acentuado que o incómodo do governo – com a moção de censura apresentada pelo PCP. É um problema para o PS ter de censurar o governo sabendo que, se fosse governo, fazia o mesmo que Passos Coelho.

*Publicado originalmente no jornal Notícias de Matosinhos